sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Lira do Amor Romântico ou a Eterna Repetição

-> Tá, agora não é uma música, e sim um poema que eu simplesmente adoro. Apesar dele ser meio grande e repetitivo... ^^'

Lira do amor romântico Ou a eterna repetição

    Atirei um limão n’água
    e fiquei vendo na margem.
    Os peixinhos responderam:
    Quem tem amor tem coragem.

    Atirei um limão n’água
    e caiu enviesado.
    Ouvi um peixe dizer:
    Melhor é o beijo roubado.

    Atirei um limão n’água,
    como faço todo ano.
    Senti que os peixes diziam:
    Todo amor vive de engano.

    Atirei um limão n’água,
    como um vidro de perfume.
    Em coro os peixes disseram:
    Joga fora teu ciúme.

    Atirei um limão n’água
    mas perdi a direção.
    Os peixes, rindo, notaram:
    Quanto dói uma paixão!

    Atirei um limão n’água,
    ele afundou um barquinho.
    Não se espantaram os peixes:
    faltava-me o teu carinho.

    Atirei um limão n’água,
    o rio logo amargou.
    Os peixinhos repetiram:
    É dor de quem muito amou.

    Atirei um limão n’água,
    o rio ficou vermelho
    e cada peixinho viu
    meu coração num espelho.

    Atirei um limão n’água
    mas depois me arrependi.
    Cada peixinho assustado
    me lembra o que já sofri.

    Atirei um limão n’água,
    antes não tivesse feito.
    Os peixinhos me acusaram
    de amar com falta de jeito.

    Atirei um limão n’água,
    fez-se logo um burburinho.
    Nenhum peixe me avisou
    da pedra no meu caminho.

    Atirei um limão n’água,
    de tão baixo ele boiou.
    Comenta o peixe mais velho:
    Infeliz quem não amou.

    Atirei um limão n’água,
    antes atirasse a vida.
    Iria viver com os peixes
    a minh’alma dolorida.

    Atirei um limão n’água,
    pedindo à água que o arraste.
    Até os peixes choraram
    porque tu me abandonaste.

    Atirei um limão n’água.
    Foi tamanho o rebuliço
    que os peixinhos protestaram:
    Se é amor, deixa disso.

    Atirei um limão n’água,
    não fez o menor ruído.
    Se os peixes nada disseram,
    tu me terás esquecido?

    Atirei um limão n’água,
    caiu certeiro: zás-trás.
    Bem me avisou um peixinho:
    Fui passado pra trás.

    Atirei um limão n’água,
    de clara ficou escura.
    Até os peixes já sabem:
    você não ama: tortura.

    Atirei um limão n’água
    e caí n’água também,
    pois os peixes me avisaram,
    que lá estava meu bem.

    Atirei um limão n’água,
    foi levado na corrente.
    Senti que os peixes diziam:
    Hás de amar eternamente.

 

Carlos Drummond de Andrade

Um comentário:

Unknown disse...

Eh mt fofo, mas pena q eh bastante grande!!!
parei na metade...xD